quinta-feira, 4 de junho de 2015

Da conversão de Jesus

Porque já há muitos adeptos benfiquistas nervosos, a dizer que querem ver o que vão dizer os sportinguistas, mesmo aqueles com quem não discuto futebol (o jogo e não os fait-divers, para os quais não tenho paciência e onde não quero gastar o meu tempo), quero deixar aqui algumas ideias sobre esta (ainda) oficiosa contratação do Jorge Jesus pelo Sporting:
  1. Para mim o Jorge Jesus é um dos 3 melhores treinadores portugueses (aqueles com quem habitualmente falo de futebol sabem disto), juntamente com o Mourinho e o Vítor Pereira. Marco Silva virá logo a seguir, a par com o Leonardo Jardim e o Paulo Sousa.
  2. O Marco Silva é um grande treinador, com tudo para crescer bastante. O Sporting jogou esta época um jogo de posse que me agrada, mas apresentou a meu ver dois pontos menos fortes que eram a organização defensiva (a linha de defesa nem sempre era bem definida e o posicionamento dos laterais por vezes deixava algo a desejar) e ofensiva (falta de jogo interior, algo que se acentuou bastante com o decorrer da época, e que tornava o seu jogo algo previsível), precisamente aquilo em que eu mais admiro o futebol do Benfica de Jorge Jesus.
  3. O Benfica aparentemente está a confiar demasiado no valor da estrutura, principalmente quando a alternativa que apresenta é o Rui Vitória (treinador que, embora reconhecendo o grande trabalho que tem feito por onde tem passado - nomeadamente Fátima, Paços de Ferreira e Guimarães -, não considero treinador de grande.
  4. O Jorge Jesus pelo contrário está a desvalorizar a importância da estrutura, como por exemplo a importância que o domínio dos bastidores do futebol que o Benfica neste momento evidencia teve neste título. No Sporting será diferente, como a recente final da Taça demonstrou. Note-se que com isto não estou a dizer que o Benfica não foi um justo campeão, que o foi - a classificação final de pelo menos os 5 primeiros reflecte o que fizeram as equipas ao longo do campeonato -, estou a dizer apenas que teria de enfrentar outro tipo de obstáculos que provavelmente inviabilizariam essa conquista.
  5. Não gosto da postura do Jorge Jesus e acho que a personalidade dele se aproxima mais à matriz Benfiquista que da Sportinguista. No inverso, sempre admirei a forma de estar e de abordar os temas do Marco Silva.
  6. Tenho sérias reservas ao sucesso deste "casamento", pela difícil convivência com o presidente, pelas condições que o Sporting lhe pode oferecer e pelo projecto desportivo do Sporting não ser o tipo de projecto onde o Jorge Jesus projectou inequivocamente a sua qualidade enquanto treinador.
  7. Lamento imenso a campanha de difamação do Marco Silva que foi lançada pela direcção do Sporting através dos jornais da Cofina. É indigno da grandeza do Sporting e fica muito mal quer à direcção quer a esses pasquins.
  8. Esta troca irá provavelmente provocar algumas convulsões quer na estrutura directiva quer no balneário.
  9. Os valores de que se fala são um exagero para a realidade do Sporting e do futebol português. Embora o potencial de vendas e de atracção extra de receita que o Jorge Jesus representa possa atenuar esse custo extra, estamos a falar de valores muito acima do que o clube estipulou como a sua política salarial. Se tiver de recorrer a investimento externo - que resta saber que tipo de retorno esperará - ainda pior.
  10. Ressalvando que não conheço o dia a dia do clube e o que se terá passado nos gabinetes da estrutura entre o Marco Silva e a direcção e levando em conta o que já apontei e o facto de o Marco Silva ter um contrato de longa duração com um custo adequado à realidade financeira do clube, preferia claramente que o Sporting tivesse dado todo o apoio e mantido o Marco Silva tendo paciência para ver o Marco Silva crescer enquanto treinador a par com o futebol da equipa.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Rescaldo Não-Desportivo do Último Derby

Sobre os incidentes do último derby e o consequente corte de relações entre os dois maiores clubes da capital, muito se tem escrito e pouco se tem acertado. Misturam-se alhos com bugalhos, argumenta-se "nós somos maus mas vocês são muito piores", tudo em irracional defesa do clube do coração. É normal, futebol é paixão logo tem uma componente irracional. Comecemos pelos incidentes de sábado, no derby de futsal. É grotesco, ninguém com um mínimo de bom senso e discernimento pode discordar, que se exiba uma tarja daquelas glorificando o mais ignóbil e triste acto praticado num estádio no nosso país. Desrespeita o adversário e todos os seus adeptos, mas principalmente a família e a memória do malogrado adepto. Numa altura em que recentemente foi moda todos serem Charlie (muitas dessas pessoas, nomeadamente as mais notáveis, de forma completamente hipócrita), qualquer adepto que não pertença a um grupo organizado de energúmenos e vá ao estádio deve dizer “Eu (também) sou Rui Mendes”. Mais grotesco ainda é que essa evocação surja associada a uma ameaça velada (“amanhã há mais”). E finalmente, é extremamente grave que isto aconteça com a complacência de um presidente que no passado se mostrou extremamente lesto a mandar remover pela segurança faixas que comportavam críticas para consigo. Já para não falar do facto de há anos apoiar ilegal e encapotadamente esse grupo de adeptos. Passando ao dia do jogo, a resposta é também de si altamente lamentável. A invocação da figura que era Eusébio no que constitui um desrespeito à sua memória (mesmo que este no final da sua vida tenha produzido afirmações lamentáveis visando o eterno rival) e a todos os benfiquistas é inominável. Mais ainda quando se associa a essa evocação a afirmação “sigam-no”, ou seja, o desejo de morte aos apoiantes do oponente. Também lamentável é a tarja que goza com a morte de um elemento da claque rival, mesmo que o objectivo fosse uma provocação menos condenável (a ridicularização dos seus líderes, algo que pode fazer parte se exercido com equilíbrio). A própria direcção do Sporting não esteve melhor na rábula do "Visitante", numa atitude saloia que mais não é que replicar tiques oriundos de outras paragens e que infelizmente entraram nos cânones do "folclore" futebolístico nacional. O comportamento dos adeptos benfiquistas acabou por ser ainda pior, pelo menos nas suas consequências, atirando no final do jogo tochas para o meio das bancadas recheadas de adeptos comuns (não eram membros de qualquer claque, que agora estão todas colocadas no outro topo do estádio), causando inclusivamente 6 feridos felizmente sem grande gravidade. Mas a tragédia de há 2 décadas podia facilmente ter-se repetido. Esteve muito mal o Sporting, ao criticar o Benfica pelo comportamento dos seus adeptos sem que antes tivesse condenado os seus. Esteve pior ainda o Benfica ao apelidar tudo isto de folclore sem se demarcar e condenar os actos perpretados pelos seus adeptos, perdendo mais uma oportunidade para o fazer e pacificar as coisas. E o resultado era facilmente adivinhável, quando há falta de bom-senso de parte a parte o conflito é inevitável e consequentemente o corte de relações institucionais (que em si não encerra grandes alterações, é um mero marcar de posição).